- Diretora faz boa adaptação de ópera cômica
Veja, 1998-07-26
Adaptação de óperas para o cinema faz parte do currículo de grandes diretores como o sueco Ingmar Bergman e o italiano Franco Zeffirelli. O Brasil, de maneira modesta, acaba de ingressar nesse clube por intermédio da diretora Carla Camurati, com o recente lançamento no Rio e em São Paulo de La Serva Padrona, ópera cômica de Giovanni Battista Pergolesi, composta em 1733. É uma "maneira modesta" de entrar no mundo da ópera por duas razões. Primeiro, porque La Serva Padrona não é uma peça de fôlego, como A Flauta Mágica, filmada por Bergman, ou La Traviata, levada às telas por Zeffirelli. Segundo, porque Carla não teve, é claro, um orçamento comparável aos utilizados pelos dois diretores. A trama de La Serva Padrona poderia ser enredo de um Sai de Baixo. Uma criada (Serpina), por meio de artimanhas infantis e com a ajuda do empregado mudo (Vespone), seduz o patrão (Uberto) e torna-se a senhora da casa. Pergolesi morreu com apenas 26 anos, na miséria, e sua melhor obra foi o famoso Stabat Mater. Ao mudar-se para a cidade de Pergola, na Itália, o compositor mudou seu nome de Draghi para Pergolesi, conforme costume da época.
O elenco desta La Serva Padrona demonstra profissionalismo e qualidade artística. A musicalidade e o talento cênico de José Carlos Leal (Uberto) e Silvia Klein (Serpina) são complementados pela competência do maestro Sérgio Magnani, à frente da correta Orquestra de Câmara Sesi Minas. Ficou divertida a inserção de um fagote irônico, inexistente na partitura original, que contracena com o humor patético de Vespone (o personagem mudo), interpretado de maneira convincente pelo ator Thales Pan Chacon, já falecido.
Carla Camurati conseguiu usar o libreto com liberdade dentro de um certo rigor estilístico. E a fidelidade à obra acabou tornou-se mais jocosa do que purista, dando ao filme um toque contemporâneo. A produção é toda em italiano, com legendas em português. Para tornar o filme acessível aos não iniciados no mundo lírico, usam-se expressões coloquiais como "panaca" e "torrando a paciência". A fita é bonita e realizada com atenção ao detalhe. Mas há alguns senões. Como a falta de sincronia entre o movimento dos arcos dos violinos e a música, especialmente no início. A reverberação do som também poderia ser mais amena. Por último, alguns trechos repetitivos da ópera talvez devessem ser cortados para não prejudicar o ritmo do filme.
Para gostar de La Serva Padrona basta alguma sensibilidade. E só um pouco de concentração. Afinal, o filme dura somente uma hora.